domingo, 6 de janeiro de 2013

O Sonho


                                            O Sonho
Talvez um sonho, talvez um pesadelo.
Nem eu sei bem ao certo o que eu vi aquela noite, naquele sonho febril.
Recordo-me bem, deste como se fosse hoje, afinal já se passaram tantos anos.
Eu um jovem de apenas 10 anos, com medo de escuro como a maioria dos meninos da minha idade. Talvez o medo tenha me feito ficar martelando sobre a vida e a morte. Hoje já com meus 26 anos nem daria importância se isso ocorresse novamente, afinal já sou um homem feito.
Bom, vamos ao dito sonho:
Estava eu em minha cidade, recordo-me bem no meio da maior rua da pacata cidade de interior, talvez fossem umas 10hs da manhã, a névoa densa encobria tudo inclusive o final da rua, que mais parecia uma rua fantasma.
Eu estava ali, mas nem sei bem como, talvez de pé, bem no meio da rua. Sentia que meus olhos estavam arregalados, meu corpo estava tenaz. Era como se meus músculos estivessem travados e meu corpo lentamente se embalasse para frente e para traz.
Sentia medo de tudo aquilo, olhava ao meu redor e nem uma viva alma.
Perguntava-me em pensamento: “Onde foi todo mundo”? O que faço aqui?
A névoa ia cada vez ficando mais forte, mas mesmo assim não sentia frio, a temperatura era daquelas de um final de tarde na primavera. Sentia arrepios de frio em minha alma.
Tinha medo de olhar para o lado, ou para traz, e ficava na mesma posição, ali coma respiração ofegante.
Estava na frente da igreja da cidade, mais precisamente na frente da praça, onde eu mal enxergava a imponente construção.
De repente, no final da rua, surgia um homem. Aos poucos sua fisionomia ia se revelando, um homem de média estatura, usava um chapéu de abas grandes, e um, sobretudo que aos passos que ele dava notava-se que este estava entreaberto.
Ele vinha em minha direção, com o rosto baixo, olhando fixamente para o chão cada vez o medo tomava conta de min.
Eram passos largos, e mesmo á dez metros de distância, conseguia ouvir o bater de suas botas no asfalto da rua.
Então ao chegar mais perto de mim pude ver que no lugar de olhos apenas tinham dois negros buracos. Levantou seu rosto e ao passar por mim, novamente baixou o rosto. Agora meu corpo todo tremia, e ligeiramente decidi olhar para traz e para minha surpresa, ele havia sumido.
Queria gritar, perguntar se havia alguém ali, mas minha voz parecia que estava presa dentro de mim.
Olhei novamente para o lado, e em cima de um poste havia uma coruja, que olhava fixamente para mim e aquilo me assustava.
Então ignorei a coruja e meu medo e comecei a caminhar. A cidade parecia ser inabitável á anos. As casas, praças, e tudo parecia perfeitamente no mesmo lugar, porém a sensação de solidão tomava conta de tudo.
Fiz força e consegui gritar: -“Tem alguém ai?”. Foi inútil, a única resposta foi o eco, que ia e vinha, ficando cada vez mais fraco, até sumir.
Continuei caminhando, até chegar à frente da praça, e ao chegar mais perto, ouvi o ranger de um portão de ferro escuro que tinha na frente desta praça.
Hesitei em entrar, mas minha curiosidade misturada ao medo fizeram meus pés irem adentrando na dita praça. Peguei o portão com uma de minhas mãos, e ali haviam pessoas, sim ali haviam pessoas, idosos, sentados em bancos dessa praça, com olhares tristes.
Resolvi chegar perto de uma senhora sentada sozinha num desses bancos. Aparentavam ter uns oitenta anos, vestia roupas que aparentavam ser da década de 1920, finas joias, chapéu, e que olhava tristemente para o chão, e ao notar que eu estava na sua frente, levantou os olhos e me olhou profundamente. Era um olhar profundo e triste ao mesmo tempo.
Agachei-me e perguntei:- “O que houve, onde estão todos nesta cidade?”.
O mesmo silêncio voltava a pairar no ar.
Levantei-me e a velha senhora continuava a olhar fixamente para o chão. Os demais na praça também continuavam ali do mesmo jeito. Dava-me raia de tudo aquilo, e também medo.
De repente do nada, o sino da igreja começava a soar, espantando os pássaros que viviam na torre da igreja.
Os velhos que ali estavam, ergueram os olhos em direção á igreja, estavam surpresos com aquele som impactante que quebrava o silêncio.
Então corri em direção á igreja, atravessei a rua e continuei a correr até chegar. Subia as escadas correndo, e a porta estava aberta.
A igreja parecia normal, como nas manhãs de domingo em que eu e meus pais íamos á missa, mas estava praticamente vazia, velas em frente ás imagens dos santos, flores, e o sino continuava á badalar acima de minha cabeça.
Num dos bancos da primeira fila, estava um senhor, também de idade avançada, com a cabeça baixa, olhava para o piso do altar. Fiquei olhando ele fixamente por alguns minutos, e resolvi me aproximar.
O cheiro das velas que ali queimavam deixava o clima de mistério cada vez mais tenso. Meus passos ecoavam no piso da casa celestial, com se fossem marteladas, que retumbavam em todos os cantos.
A névoa impedia que os vitrais refletissem as imagens sagradas no chão.
Então depois de ter percorrido toda igreja admirando a igreja pouco iluminada, cheguei à frente dos bancos onde o senhor encontrava-se praticamente imóvel.
Sentei-me ao seu lado e ele elevou o olhar até mim.
Seus olhos eram como o da velha senhora da praça.
“-Sei que quer saber sobre todos”... , falou o senhor.
Falou-me ele, como se ouvisse meus pensamentos.
“-Até que em fim alguém que me responde, além do fato de todos nesta cidade terem sumido, ninguém me fala nada!”, respondi quase aos berros.
“-Você não percebeu?”, quase sussurrando respondia-me o velho homem.
“-Perceber o que?”, indaguei, com toda a curiosidade do mundo.
“-Olhe atentamente para meus olhos”, olhando-me profundamente nos meus olhos.
Percebi que seus olhos não me eram estranhos, mas mesmo assim não os reconheci de primeira vista. Sim eram meus olhos ali naquele rosto encravado de rugas e sinais do tempo. Sim! Era eu! Eu! Meu rosto, minha pele, meus olhos, estava mais assustado que antes agora!
Dei um pulo do banco, e quase cai no chão. O olhar dele acompanhava-me atento.
Irei ficar assim? Perguntava-me em pensamento.
“-Não se assuste, a velhice é uma consequência natural da vida, assim como a morte!” explicava ainda sentado.
“-Se é assim que estou, e onde estão minha família, meus amigos, o restante da população?” indaguei com medo da resposta.
“-Como lhe disse, a morte é uma consequência natural da vida...”.
Sacudi cabeça em sinal de negação e levantei-me do chão.
Virei-me de costas e já com os olhos já querendo lacrimejar, pus-me a andar em direção à porta da igreja.
A névoa havia se dissipado e o Sol estava lá imponente em seu lugar de sempre. Mas a cidade continuava vazia, e o brilho do astro solar cegava-me. Desci as escadas e corri até a parte de traz da igreja, onde havia um poço, ou cacimba, aonde antigamente as pessoas vinham buscar água.
Estava cheia, então abri sua tampa e fiquei a pensar no que o “eu” havia dito.
Olhava meu reflexo distorcido pelas pequenas ondas na água do poço, e ficava me imaginado, velho e sem ninguém.
Sentei-me na beirada e fiquei pensando como seria minha vida da li pra frente. De repente o vento começou a soprar, e como se as águas me seduzissem para dentro do poço, e uma súbita vontade de jogar-me para dentro do poço.
Retirei a tampa pesada de concreto para um lado, e fiquei a olhar fixamente ás águas. Num rápido movimento atirei-me dentro do profundo poço.
As águas eram geladas, e as sentir tocando minha pele, era como se fosse afiadas facas cortando meu corpo.
Ao mergulhar totalmente nas águas do poço, senti meu corpo estar em dois lugares ao mesmo tempo, no poço e em minha cama, ensopada de suor, e então meus olhos se abriram...
Estava em meu quarto, olhando fixamente para o teto, ainda noite, aonde poucos raios de luz vindo dos postes iluminavam meu quarto.
Não consegui dormir mais aquela noite, e fiquei pensando naquele maldito pesadelo.
Foi a única vez que me ocorreu.
Os anos passaram e eu foi embora da pequena cidade, vivi com outras pessoas, mas as vezes fico pensando no que eu me disse naquele sonho ...

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